terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Artigo: Relação homem x animal


Por Ana Maya Goto Uyehara – Pesquisadora Mentora
ana.uyehara@uninove.br

As evidências mais antigas da amizade entre o homem e os cães datam de 12 mil anos antes de Cristo, em que ossos de homens e cães aparecem na mesma tumba. A interação homem-animal tem sido abordada pela sociologia, psicologia, antropologia, medicina veterinária e outras ciências. Para Fuchs (apud Bellinghini, 2003:C5), tudo pode ter começado com um lobinho mais manso que os demais e com a percepção de que eles podiam dar sinais de alarme e, principalmente, ajudar nas caçadas:
Os filhotes de lobos e cães são criados em família, com a mãe e os irmãos. Quando tirados de perto deles, vão procurar esse calor e aconchego com seres humanos, que passam a ser sua nova figura de apego.
Mas também pode ter começado por outras duas razões: frio e fome. Para se livrar do frio, o homem das cavernas dormia com o cão e, como retribuição, dava-lhe restos de comida. Com isso, livrava-se também do lixo. Na mitologia grega, acredita-se que a alma do cão acompanha seu dono até a eternidade. Isso talvez justifique a crença popular de que “cada cachorro espelha a personalidade de seu dono”.
Segundo Berzins (2000:55), estudos apontam para a relação homem-animal na pré-história. Foram encontrados sítios arqueológicos dessa época em que o animal doméstico era enterrado em posição de destaque ao lado do seu provável dono. Mas a grande mudança deu-se a partir dos tempos modernos, com a criação de cães para a função principal de guarda da propriedade, de tração de carroças e trenós, ou utilidade para acompanhar tropeiros, agricultores, além da condição de estimação.
Havia uma distinção social entre os cães imposta pelos homens e, no século XVIII, o cão já era conhecido como “o mais inteligente de todos os quadrúpedes conhecidos” e louvado como “o servo mais fidedigno e a companhia mais humilde do homem” (Berzins, 2000:57).


Benefícios da relação homem/animal

Ter um bicho de estimação pode não ser apenas uma questão de lazer ou de companhia. A medicina está descobrindo que eles também podem ser benéficos para a saúde humana. Estudos do American Journal of Cardiology mostram que pessoas, ao interagirem com animais, constantemente tendem a apresentar níveis controlados de estresse e de pressão arterial, além de estarem menos propensas a desenvolver problemas cardíacos (Vicária, 2003:91). Em termos psicológicos, os cães, através de sua pureza e espontaneidade instintiva, resgatam a criança interior da pessoa e aumentam a capacidade de amar da mesma, conforme aponta Kassis (2002:24-25).
Berzins (2000:61) observa que estudos efetuados nos Estados Unidos e na Europa apontam para uma redução do tempo de recuperação das doenças e uma maior sobrevida aos indivíduos que possuem animais de estimação e que foram acometidos por cardiopatia isquêmica. Percebe-se que, nessas situações, a presença do animal resultou na redução da ansiedade, diminuição de depressão, uma vez que os animais incentivam a atividade física, tanto para levá-los aos passeios como para a realização dos cuidados diários.
Interessante notar que, durante a internação, os pacientes demonstram desejos de melhorar rapidamente para cuidar de seus animais. Conclui-se então que os animais podem atuar como suporte emocional, representando um apoio para confiar e falar. Em outras palavras, como o animal não fala, ele passa a ser cúmplice do que os outros lhe contam (Berzins, 2000:63).
Em se tratando de cães, essa interação é favorecida, sobretudo, quando eles são utilizados nas terapias para equilibrar emoções, conforme aponta Fenuccio (apud Vicaria, 2003:91) que venceu a depressão com a ajuda de um vira-lata de 04 anos: “ele é ótimo, entende que às vezes não estou bem e nem por isso me abandona”.
Estudos desenvolvidos na área de Medicina Veterinária da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp), em Botucatu, evidenciam que o contato com animais melhora os batimentos cardíacos dos idosos, além do estímulo emocional resultante da troca de carinhos.
Berzins (2000:64) também cita algumas vantagens resultantes do convívio com animal de estimação, elencados pr Fuchs (1987), como:

- alívio para situação tensa;

- disponibilidade ininterrupta de afeto;

- faz a pessoa rir;

- representa companhia constante;

- dá amizade incondicional;

- proporciona contato físico;

- dá proteção e segurança;

- a presença do animal faz a pessoa ter o que fazer.


Ressalta-se, contudo, que a relação homem-animal não deve substituir a relação homem-homem. O cão não pode substituir um filho ou marido, mas pode ensinar como agir em nossos relacionamentos (Kassis, 2002:25).

Convívio idoso x cão

Berzins relata em sua pesquisa que iniciou seu contato com idosos a partir das queixas dos médicos veterinários quanto à dificuldade de lidar com idosos que insistiam em infringir a lei, mantendo mais de 10 animais domésticos em suas residências. Ela cita alguns exemplos dos encaminhamentos feitos para o Serviço Social, setor onde trabalhava na Prefeitura de São Paulo, como segue (2000:16):

Trata-se de pessoa idosa que se descontrola facilmente. Sugiro que a assistente social tente diálogo com a intimada; Encaminhamos o presente expediente, sendo que a proprietária dos animais é idosa e de difícil trato, e o problema com falta de higiene na criação de cães e gatos vem causando incômodo aos demais moradores; Sugiro que a assistente social vá ao local fazer uma visita devido ao fato da intimada ser idosa; Trata-se de uma pessoa doente, idosa e difícil de se conversar.

Buscando compreender a relação que se estabelece entre o idoso e o animal doméstico, que, no caso, não significa animal de estimação pela intensidade da relação que os idosos mantêm com todos os seus animais, Berzins (2000:18), ao pesquisar os casos de idosos que possuem mais de 10 animais e em alguns casos até mais de 50, percebe que “com cada um dos animais são estabelecidas relações únicas, singulares e permeadas de profundo significado”. Observou, então, que o animal pode representar a compensação para o “ninho vazio”, a vida sem sentido, falta de convívio com os familiares, “aqueles idosos não tinham outra razão de viver, senão os animais”, “não há pessoas em suas vidas, somente animais”.

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